Que estou na Terra de onde saí há 33 anos e onde nasci há 64. Vim encontrar amigos que me reconheceram. Vim encontrar amigos do coração. Vim encontrar Gente Boa. Por favor compreendam-me. Não estou com estas palavras a dizer que não encontro Gente Boa onde vivo actualmente e naqueles para quem trabalho semana após semana através deste semanário. Aliás, aqueles que fizeram o favor de acompanharem a minha carreira profissional sabem como eu sempre os tratei por “Gente Boa”. Na abertura dos meus programas, tanto na rádio, como na televisão, sempre os abri com o sistemático e carismático, “Olá, Gente Boa!”. Isto, apesar de várias tentativas de responsáveis que achavam que era um “cliché” muito banal e vulgar. Mas, eu sempre insisti e consegui ultrapassar esses obstáculos. E nunca tive a menor dúvida em saudar os meus ouvintes e/ou telespectadores com um sonante “Olá Gente Boa, Boa Tarde, ou Boa noite (conforme fosse o caso)”.
Saí de Lisboa já ao fim do dia,
para me acomodar algures dentro de um avião da TAP e me instalar para aquele que seria um voo directo de quase doze horas até ao Maputo. Quase que escrevia Lourenço Marques, mas claro que sabia que não iria encontrar Lourenço Marques, mas sim Maputo. Diferenças? Em 33 anos, muito aconteceu.
Eu que sou um homem positivo, que gosto de realçar o que é bom e de esquecer o que é menos bom, reconheço que desta feita terei que me debruçar, de alma e coração, sobre este tema a que chamei: Aqui Maputo, Moçambique!
A enorme nave voadora aterrou no aeroporto de Mavalane, para encontrar uma imagem que fez com que tivesse que me beliscar, para ter a certeza de que não estava a sonhar. Uma sensação indescritível. Algo que nunca tinha sentido circular pelo meu corpo, pelas minhas veias, pelos meus músculos, pelos meus ossos, pelo meu cérebro, pelo meu esófago, pelas minhas entranhas. Um “feeling” que me dizia: Eu que nunca esperava voltar a pisar a terra que me viu nascer e crescer, ali estava novamente.
Levantei a cabeça. Espevitei. Sacudi o nervosismo e disse para comigo mesmo que tinha que saber encarar esta situação com altivez, com garbo, com orgulho e, acima de tudo, com muita alegria, com magnanimidade. E, foi isso que fiz. Ou melhor, que decidi fazer.
O que encontrei? Um aeroporto do lado das pistas de aterragem, muito igual ao que eu conhecia. Apetecia-me dizer: Muito igual ao que vi quando parti. Só que não foi por ali que eu parti. A minha saída foi uma odisseia, pela fronteira da Namaacha, para a Suazilândia, África do Sul, Portugal e Canadá. O meu regresso foi do Canadá para Portugal e de Lisboa directo ao Maputo..
Do lado de fora, o Aeroporto de Mavalane está envolvido num mundo de reconstrução.
À porta da secção de apresentação dos passaportes, tenho um amigo à minha espera. O Alberto Silva, que está muito ligado ao Canadá, não só pelos familiares que tem no país onde resido actualmente, como também pelo trabalho que desempenha em Maputo, relacionado com o Canadá. Um amigo que me abriu portas a mais amizades, como a sua família, a quem agradeço do fundo do coração pelo acolhimento que me ajudou a ultrapassar as dificuldades, especialmente emocionais.
A Tayma e o Beto, foram os meus guias, os meus salvadores na concretização de todos os meus desejos. Os mesmos, como devem calcular, estavam relacionados com o reviver, o reconhecer, o voltar a testemunhar todos aqueles cantos de 31 anos de vivência. Só com a ajuda e a dedicação do Beto e da Tayma, sem descurar a Bibane e o Mariano, eu vi em meia dúzia de dias tudo quanto era importante ver.
E o que vi? Primeiro, um aeroporto em obras, com os Chineses a ajudar Moçambique e a chamarem a si a responsabilidade de grandes projectos de recuperação e de remodelação. Um deles, a transformação do aeroporto internacional do Maputo
Depois, o trajecto para a cidade. Muito ao jeito do que era. Ou melhor do que eu conheci. A principal alteração foi a existência de meios de transporte que me eram desconhecidos, como são os casos dos “chapas”,
carrinhas que efectuam trajectos pré-estabelecidos e que são uma solução de transporte por muitos adoptada, substituindo os velhos machimbombos. Depois, as novas ruas que proporcionam ligações que não existiam. Uma quantidade muito maior de carros e muita gente. Mesmo muita gente.
Logo após a minha chegada, levaram-me a ver tudo quanto eu queria ver. A casa onde eu vivia. As ruas onde cresci. As Escolas que frequentei. Muitos nomes diferentes. Outros, mantiveram-se. A rua mais longa do Maputo, continua a ser a 24 de Julho.
A Polana continua a ser o bairro mais atraente. Muitos hotéis, muitos restaurantes. O meu querido Piri-Piri. Parámos. Fomos almoçar ao Piri-Piri.
Podia ter optado pela Galinha à Cafreal. Mas, não. Tinha que comer Camarões Grelhados, com molho de manteiga e limão, acompanhados por batatas fritas... E uma Catembe (Vinho Tinto com Coca-Cola). Há quantos anos eu sonhava com aquele momento.
A Avenida 24 de Julho com a Pêro de Alenquer (agora Amílcar Cabral), onde a minha juventude se concentrou. Onde conheci o primeiro amor do meu coração. O Colégio Barroso, que já não é. Os Maristas, que já não são. A Cristal, que ainda é. A Escola Comercial, que já não é. A Escola Industrial, que ainda é.
Mais abaixo, a Escola Correia da Silva, que também foi a minha Escola Primária. O local onde tive o meu primeiro acto de coragem, ao saltar de uma plataforma de mais de cinco metros de altura para o chão, lá estava, exactamente no mesmo sítio.
O Rádio Clube de Moçambique, agora Rádio Moçambique.
O Jardim Vasco da Gama, que já não é. O Clube de Ténis do Jardim, que ainda é exactamente a mesma coisa e que tem como Presidente o meu amigo, e nesta situação meu guia, o Alberto Silva.
O Prédio da Ateneia, em frente ao Prédio do Montepio, que já não são conhecidos por estas referências, mas que estão lá, iguaizinhos aos que lá deixei. A Estação dos Caminhos-de-ferro,
a Rua Consiglieri Pedroso (que ainda é Consiglieri Pedroso), onde residi dos dois aos doze anos. O renovado edifício do Catoja & Saldanha, onde a minha mãe trabalhou durante mais de trinta anos.
Palmilhei a Rua Major Araújo, que era conhecida como a Rua do Pecado.
E, é verdade que já não existem os “night clubs” de então, mas lá que continua a ser a Rua do Pecado, disso não tenham dúvidas. Calcorreei a baixa do Maputo, onde infelizmente muitos dos prédios estão abandonados e sem qualquer tipo de manutenção. Mas eram aqueles os edifícios que eu conhecia.
A Praça 7 de Março, que já não é, virou uma verdadeira Feira de Artesanato. A Fortaleza, onde fui encontrar as estátuas de António Enes e de Mouzinho de Albuquerque.
A ida às instalações do Desportivo e do ex-Sporting.
Encontrar o velhote Gomes (72 anos), ainda a funcionar como o “faz-tudo”.
O Sebastião, o “roupeiro” do Basquetebol do Sporting, o Pavilhão, o campo de futebol, onde quando miúdo eu esperava que um adulto me desse a mão para que eu pudesse ver o futebol.. Foi, meus caros amigos, algo do outro mundo.
Depois, uns telefonemas, para mais Gente Boa, e logo me apareceu o Nuno Narcy. Eu estava a cair de morto. Já não dormia há dois dias. Mas, resisti. Conversámos até altas horas da manhã. E combinámos passar um domingo inesquecível. Um treino de basquetebol exactamente no mesmo recinto desportivo onde vivi anos e anos do meu trajecto como treinador daquela modalidade no então, Sporting Clube de Lourenço Marques e hoje o Clube Maxaquene.
Depois, levaram-me pela marginal fora. Onde estava o Dragão de Ouro, fui encontrar um hotel de grande luxo, o Southern Sun. Cinco estrelas.
Seguiu-se o Restaurante do Miramar, os resorts de férias, onde era o recinto do acampamento, o Peters, até chegarmos ao Restaurante da Costa do Sol. Simplesmente inacreditável.
O regresso à cidade e a ida ao antigo Dicca, hoje Teatro Gungu. Levaram-me a ver a peça teatral que tem por titulo: “Sexta-feira, dia do homem!”. Deu para rir à gargalhada e para testemunhar um excelente grupo de artistas. O meu agradecimento ao Beto e à Tayma.
O Nuno Narcy encarregou-se de reunir muitos dos amigos relacionados com o basquetebol dos nossos tempos. “Convocou” o António Alves da Fonseca, que apesar dos seus 80 anos, não deixou de estar presente.
António Alves da Fonseca, foi o primeiro empresário que me contratou para trabalhar na Rádio. Proprietário então das Produções Golo, dono ainda hoje, das mesmas Produções Golo, a melhor e maior agência de publicidade de Moçambique. Ele lá estava. Para além do Nuno Narcy, o Vítor Morgado, o Fernando Silva, o Simango, o Mariano Narcy, o João Domingues, o João Vaz, o Valdemar Cortez, o Miguel da Mata, o Conde e tantos outros.
Um treino de basquetebol que serviu de pretexto para aquele que prevalecerá para sempre como um dos melhores almoços a que jamais estive presente, um restaurante bem português, o Taverna, dirigido pelo Nuno (também ele Nuno) e a esposa, com uma cozinha do outro mundo.
Depois, a partida para o Hotel Terminus, em plena Polana,
mais precisamente para o Pool Bar deste recatado hotel em Maputo, onde bebemos um Irish Cofee. Horas maravilhosas, na companhia de um jovem de 80 anos de idade, o sempre amigo António Alves da Fonseca, e de Nuno Narcy, um jovem de 57 anos.
Rádio Moçambique e TV Moçambique
Em Portugal fui recebido e reconhecido pela RTP como convidado do programa Portugal Sem Fronteiras. Em Moçambique, meus caros amigos, foi do outro mundo.
Como já tiveram oportunidade de compreender, este regresso à terra que me viu nascer, 33 anos depois, deixava em mim uma grande ansiedade. Como é que eu seria recebido? Os meus amigos... Será que seriam ainda meus amigos? Estariam zangados comigo por eu ter procurado a minha vida noutro país?
Mas que surpresa. A recepção ultrapassou todas as expectativas.
Depois de estabelecidos os contactos que já descrevi, começo a receber telefonemas. Da Rádio Moçambique e da Televisão de Moçambique. Claro que fui logo a correr. Na Rádio, uma entrevista que durou mais de uma hora, feita por um verdadeiro profissional, o Zé Durbeq,
com chamadas que me deixaram a chorar. O meu maior ídolo da radiodifusão desportiva, o melhor locutor desportivo em português que jamais conheci, aquele que me deu a mão quando comecei esta difícil profissão, o meu amigo do coração, João de Sousa,
telefonou da cidade de Pretória, onde agora ele chefia a Delegação da Rádio Moçambique e tivemos oportunidade de voltarmos a estar juntos no ar, na Rádio que nos viu nascer. Na Televisão, outra hora. E saí, tanto de uma, como de outra, com os maiores e melhores elogios que poderia conceber. Simplesmente sensacional.
Como é bom saber que em Portugal e em Moçambique há quem nos dá valor e reconhece o trabalho desenvolvido há mais de 40 anos.
Obrigado, Portugal... Obrigado, Moçambique!
Do Maputo, para Joanesburgo!
Dia com lágrima ao canto do olho, foi aquele em que quase perdia o avião do Maputo para Joanesburgo. É verdade. A Tayma levou-me ao aeroporto.
Como boa moçambicana que é, foi levada nas calmas que também eu, moçambicano, perfilho. O avião, da South African Airways tinha a sua partida marcada para as 11.45 da manhã. Eram 10.45 e ainda estávamos a entregar uma encomenda que a Tayma tinha que deixar na Universidade.
“Tayma, já são 10.45, hora a que eu devia estar no aeroporto, mas ainda estamos na Universidade!” (para os lados da Sommerchield). “Ah, não há problema. Os aviões nunca saem à hora prevista!” Diz a Tayma. Pois, pois. Quando cheguei ao “check-in”, a resposta que me deram foi: “Temos muita pena, mas o voo já está fechado!” Ai, ai, ai... Bom, lá tive que puxar do meu mais profundo charme, para convencer as simpáticas senhoritas que tinha mesmo que embarcar.
Foi então que uma jovem me disse: “O senhor não diga que só chegou agora, vai dizer que já está aqui há muito tempo, mas que não ouviu a chamada.” Bem dito e bem feito. Minutos depois estava dentro da enorme nave da SAA, a caminho do aeroporto Oliver Tambo em Joanesburgo.
Cinquenta e poucos minutos de um voo calmo e tranquilo e chegámos a Joanesburgo. Saio do avião e fico boquiaberto. Meus caros amigos, acreditem, ou não, mas a verdade é que deparei com um aeroporto que nada fica a dever aos melhores do mundo. O aeroporto Oliver Tambo está pronto para receber os muitos adeptos do futebol que em 2010 vão acompanhar de perto as 32 selecções que vão disputar o Campeonato do Mundo de Futebol.
O Aeroporto Internacional Oliver Tambo é um aeroporto importante que se situa no distrito de Gauteng, em Joanesburgo.
É usado como principal aeroporto para viagens nacionais e internacionais da África do Sul e é o de maior movimento em África, sendo utilizado por mais de 20 milhões de passageiros anualmente. O aeroporto é a base de operações para a maior linha aérea tanto de voos nacionais como internacionais da África do Sul, a South African Airways, e para outras linhas aéreas locais menores.
Anteriormente o conhecido oficialmente como Aeroporto Internacional de Joanesburgo e antes dele, Aeroporto Internacional Jan Smuts (a ele se deve o código OACI do aeroporto, FAJS) em homenagem ao estadista de mesmo nome.
A primeira alteração de nome foi feita em 1994 quando o reformado governo da África do Sul implementou uma política a nível nacional de não utilizar nomes de políticos no nome dos aeroportos.
Foi renomeado novamente em 27 de Outubro de 2006 em homenagem a Oliver Tambo, o ex-presidente do partido Sul - africano do Congresso Nacional Africano.
Um aeroporto sensacional, para um Joanesburgo, não menos espectacular!
Não vou querer estabelecer qual tipo de comparação. Nem pensar nisso. Maputo, é Maputo. Joanesburgo, é Joanesburgo.
Só que as gentes com quem convivi, essas, são também moçambicanas. Vivem no país ao lado. Um país que teve grandes lutas, como descrevemos noutro artigo que também publicamos nesta edição.
Sou recebido com muito calor e carinho. Saio do edifício principal (e gigantesco) da gare principal do Oliver Tambo, para um estacionamento interior ainda maior. Uma curiosidade. Nos tetos, muitas luzinhas vermelhas e algumas verdes. As encarnadas eram demonstrativas dos lugares de estacionamento que estavam ocupados, e as verdes, dos que estavam livres. Bonito, não é?
Do aeroporto, até ao Hotel Nicol, onde fiquei hospedado, pouco mais do que 20 minutos, o que significa que o aeroporto até nem fica longe da cidade.
Depois o cumprimento das minhas obrigações e a possibilidade de estar com mais amigos do coração.
Os estádios, as auto-estradas, os novos hotéis, está quase tudo a postos para a grande festa do Campeonato do Mundo de Futebol de 2010, que, pela primeira vez é disputado em África.
Só que a África do Sul é um país muito a sério, e gigantesco. Importante (e podemos garanti-lo porque vimos com os nossos próprios olhos), a segurança por todos os cantos. As protecções e os sistemas aplicados para que os visitantes se sintam à vontade. Neste país, segurança é algo que não passa, nem ao lado, nem despercebido.
Depois, a possibilidade de conviver com o velho amigo Carlos Serra
e a sua esposa Lena Serra, que já não via desde os bons tempos do Basquetebol no Sporting Clube de Lourenço Marques. E ainda o Artur Meirim,
a sua esposa Gabriela, e os filhos Giselle e Hugo. Com ambos confraternizei e chorei lágrimas de felicidade. Levaram-me a tudo quanto era sítio agradável. Adorei.
Também não posso esquecer o rever do meu amigo Dr. Carlos Correia Mendes. Como ele me recebeu com um abração. E enquanto conversámos no seu consultório, eu, o Carlos e a Lena, e, claro, o Carlos Correia Mendes, deu-se a possibilidade de visitar mais amigos, na ocasião o Carlos Borges e a sua esposa, a Aline Borges, que vivem noutra zona residencial e que, tal como o Carlos Serra e o Artur Meirim, me colocaram muito à-vontade nas suas lindas residências. Que maravilha. Tudo gente boa. Tudo gente moçambicana.
Estive relativamente pouco tempo em Joanesburgo, mas o suficiente para não ter a menor dúvida em como os amigos que por lá estão, estão, felizmente, bem, e claro a todos quero deixar aqui o meu agradecimento.
A Lena Serra teve a amabilidade de me levar ao aeroporto e num ápice estava concluído o meu périplo africano.
Como conclusão: Vontade muito grande de voltar. Vontade muito grande de voltar a abraçar os meus amigos. Por isso me despeço com um Kanimambo e Hambanine.
Até breve!
MUNDOSLAM agradece ao amigo José Alexandre Franco (JAF) esta bonita reportagem realizada por terras africanas (Moçambique e África do Sul). Podemos afirmar que foi mais um “slam dunk” à imagem do JAF.
2 comentários:
Fantástico, apenas fantástico. Sem mais palavras, sabe maravilhosamente bem ler e ver estas fotos em pleno dia de Natal.
OBRIGADO!!
Ena pá, não vejo aqui as fotos... Será que as vetaram no Conselho de Sapientes Sábios do Caril? O seu presidente anda muito rigoroso. Tudo o que não seja caril do Alentejo não entra aqui. Ufa...
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